Parábola da prisão (I)
Um enfoque iniciático
Era uma vez um prisioneiro que nasceu em uma prisão. Todos os seus antepassados também nasceram e viveram nessa prisão.
A prisão, por definição, é de segurança máxima, caracterizada por altos e espessos muros. Tendo, ainda, uma guarda muito vigilante, efetiva, incorruptível.
1ª pergunta (no âmbito iniciático): Nessas condições, o que este prisioneiro mais deseja? O que ele mais quer? O que mais anseia?
Naturalmente seríamos levados a responder que seria a liberdade. Mas, como ele nasceu aí (dentro da prisão) e não conhece nada mais do que o espaço limitado pelos muros, esse não é o seu maior desejo. Na verdade, ele nem se dá conta que está preso.
Após muitas digressões, podemos concluir que o que ele mais deseja poderia ser tudo o que a prisão possa lhe oferecer para satisfazer a sua sensualidade (de sensações) ou os seus desejos. Tais como: ter uma cela maior, com todas as condições para lhe proporcionar mais conforto.
Além disso, seria importante talvez ter mais de uma cela, uma em cada canto da prisão; também seria importante ter uma alimentação mais variada e em maior quantidade. Também poderia desejar ter maior variedade de roupas “de grife” e diversos meios de transportes para se locomover dentro da prisão; talvez um carro do ano para si, outro para a esposa, outros para cada um de seus filhos, outro ainda para levar os cachorros para passear e mais um para transportar seus gatos, ou seja, seus desejos são insaciáveis e deseja sempre mais e mais.
Evidentemente que a prisão não pode oferecer tudo o que todos os presos possam desejar. Assim os prisioneiros desenvolvem atributos para ter mais que os demais presos. Atributos como: orgulho, vaidade, egoísmo. Passa a ser maledicente, ambicioso, guloso, melindroso, malicioso, mentiroso, pretensioso e quase todos os demais “-oso” que conhecemos. Tornando-se assim um preso muito conhecido, muito popular, muito visível.
Com o passar do tempo, alguns presos, raros, raríssimos, começam a pensar que a vida não pode ser só isso. Na verdade, esse tipo de preso que, tendo ou não tudo o que deseja, começa a ficar insatisfeito com tudo que a prisão lhe possa oferecer; pois tudo isso não lhe satisfaz a alma. Então essa insatisfação cresce dentro de si e começa a se perguntar:
2ª) Será que há algo além dos muros dessa prisão?
Ele não sabe se há algo além dos muros. Mas o desejo de saber torna-se incontrolável e começa a pensar em ultrapassar os muros para saber se pode haver algo além desses muros. Ele não sabe se existe. E se houver algo, não sabe se será melhor ou pior do que o existente dentro da prisão que ele conhece. Isso deixa de ser importante, porque o desejo de saber se existe algo mais é incontrolável e ele fará de tudo para ultrapassar os muros da prisão.
Nesse momento, dá-se conta que, ao desenvolver os atributos para obter tudo e em maior quantidade o que a prisão possa lhe oferecer, ele tornou-se um preso muito visível e, mesmo que consiga ultrapassar os muros da prisão, a guarda vigilante prontamente dará por sua falta e irá recuperá-lo. Portanto, o preso conclui que precisa mudar seu modo de ser, busca um comportamento para tornar-se invisível, para poder escapar.
3ª) Como um preso muito visível (com todos os atributos anteriormente mencionados e adquiridos com muito esforço) torna-se um preso invisível? Que ninguém possa se dar conta que ele existe?
Após muitas conjecturas, chega-se à conclusão de que, para passar de muita visibilidade para pouca ou nenhuma visibilidade, o preso tem que seguir e observar todas as leis e regras da prisão, isto é, deve tornar-se um preso exemplar, com quem a guarda não tenha que se preocupar. Passa, então, a cumprir com todas as regras e leis da prisão, adquirindo assim novos hábitos.
Para esse preso, se as leis e regras da prisão são justas ou não, deixa de ter importância. O importante passa a tornar-se o mais invisível possível para poder escapar.
Também começa a se perguntar:
4ª) Será que consigo escapar sozinho desta prisão?
Por definição, a prisão foi conceituada como de alta segurança, portanto é impossível escapar sozinho. Se fosse possível fugir só, a prisão não seria de alta segurança.
Se não pode escapar sozinho, alternativamente, será que todos os presos podem escapar ao mesmo tempo? Também por dedução, sendo a guarda efetiva e incorruptível, isto não é possível. Se todos escapassem ao mesmo tempo, a guarda daria pela falta dos prisioneiros e prontamente iria recapturá-los. E talvez muitos não quisessem sair daí.
Ou seja, escapar só ou todos ao mesmo tempo é impossível. Mas um pequeno grupo talvez consiga ultrapassar os muros da prisão.
5ª) Se sozinho ou todos juntos é impossível escapar, do que necessita o preso para ultrapassar os muros?
Resposta: Necessita de ajuda.
Ajuda de quem? Ajuda de fora da prisão e de um pequeno grupo de presos. Sendo a guarda efetiva e incorruptível, o preso só pode contar com ajuda de outros presos da prisão e dos que já escaparam e estão fora da prisão.
6ª) Como formaria este pequeno grupo? Com seus familiares, seus amigos ou companheiros de trabalho mais chegados na prisão?
Claro que não, pois se ele convidar essas pessoas que talvez estejam muito satisfeitas com a prisão, por elas o quererem (ou amarem) muito, vão entregá-lo à guarda ou chamar o hospício e colocá-lo em camisa de força, pois ele só pode ter enlouquecido. Afinal, a prisão é tão boa!
Então, ele só pode contar com a ajuda de outros presos que tenham a mesma insatisfação com o que existe intramuros na prisão, que tenham as mesmas aspirações que ele de escapar desse lugar e que já começaram a mudar seus hábitos para tornarem-se invisíveis.
Então o preso insatisfeito só tem que encontrar outros homens iguais a ele, ou seja, presos que estão se esforçando para se tornarem invisíveis. Essa não é uma tarefa fácil. Como encontrar homens invisíveis? Para tanto, tem que aprender a observar presos invisíveis, pois até o momento só conseguia ver homens visíveis.
Imaginemos que consiga encontrar outros homens invisíveis e formar um pequeno grupo.
7ª) Ter o pequeno grupo é o suficiente para escapar?
Não. No mínimo, terão que obter ferramentas que os ajudem a cavar um túnel ou a escalar os muros (tarefa mais difícil, pois a guarda é vigilante).
Surge o problema: onde obter as ferramentas? Lembremos que a guarda é efetiva e, todos os dias, a determinada hora do dia, faz um inventário de tudo que há na prisão e, se percebem a falta de uma colher que seja, se colocam de prontidão e não se aquietarão até encontrá-la.
Resumindo, as ferramentas não podem ser obtidas dentro da prisão. Então elas só poderão vir de fora da prisão, que os prisioneiros insatisfeitos não sabem se existe algo ou alguém além dos muros.
Portanto, além da ajuda de outros presos (dentro da prisão), necessitam de ajuda de fora (que eles não sabem se existe!).
Imaginemos, mais uma vez, que de qualquer maneira consigam as ferramentas necessárias.
8ª) Já têm o grupo formado e têm ferramentas. É o suficiente para ultrapassar os muros da prisão?
O grupo de insatisfeitos, formado e de posse de ferramentas, começa a cavar o túnel e faz muitos esforços, mas pode acontecer que, apesar dos esforços realizados, saiam dentro da sala da guarda, na sala do diretor da prisão ou se defrontem com uma fundação profunda da muralha e não consigam escapar. Ou seja, o grupo pode fazer esforços desnecessários.
Para que isso não ocorra, é preciso, ainda, algo mais: um plano de fuga. Um plano que especifique as ferramentas necessárias, como utilizar cada uma delas, quando utilizá-las e que direção (e comprimento) o túnel deve ter.
Este plano também terá que vir de fora da prisão, pois intramuros os indivíduos não sabem como a prisão foi construída e se há pontos fracos, como, por exemplo, se há pontos onde a fundação dos muros não é muito profunda. Tão importante é este plano que ele recebe um nome: escola iniciática.
Após tudo ajustado e os esforços realizados, pode ser que o grupo consiga escapar, mas não há segurança que isto ocorrerá.
Interpretando a parábola
O que significa o preso?
Significa a Humanidade.
O que significa a prisão?
Significa a materialidade.
A materialidade, no seu sentido mais amplo, além do corpo físico, dos objetos e bens materiais, abrange a família, a profissão, o nome do preso e sua personalidade (considerada como tudo que foi assimilado pelo preso desde que nasceu).
Se a prisão significa a materialidade, fora da prisão temos a espiritualidade. Que tipo de espiritualidade irá auxiliar o preso insatisfeito? A espiritualidade moralmente superior ou moralmente inferior ao preso?
Só pode ser a espiritualidade superior, pois a espiritualidade inferior prefere ficar intramuros, onde pode também satisfazer sua sensualidade, ela está atada à materialidade.
O que significa a guarda?
Os guardas são as pessoas do nosso entorno social, que nos vigiam e não querem perder o nosso convívio: os familiares, os amigos, os vizinhos, os companheiros de trabalho. Paradoxalmente, nossos “inimigos” podem ser nossos verdadeiros “amigos” se nos apontam quais são nossos traços principais que nos mantêm na prisão da materialidade.
Portanto, esta parábola é válida para todos os mundos materiais que tenham uma humanidade e não somente para a humanidade terrestre.
Pela parábola, o plano de fuga é um fator essencial para que o Homem possa libertar-se da materialidade e vamos designá-lo com o nome de iniciação espiritual (ou Escola Iniciática).
Note que todas as verdadeiras religiões propõem que os homens devem ser pessoas melhores (anjos) para merecer o reino dos céus, mas têm dificuldade em ensinar como transformar-se em pessoas melhores; quem faz isso são os planos de escape (as escolas iniciáticas).
Escola Iniciática, nessa concepção, é uma escola prática (onde os aspectos filosóficos ou teóricos não são predominantes) onde o adepto pode realizar a sua evolução espiritual (ou transformação moral).
Desde o início da humanidade, a Espiritualidade Superior tem ofertado aos homens diversas escolas iniciáticas. Em 1950, enviou mais uma: a Escola de Aprendizes do Evangelho; que é uma entre tantas outras que não conhecemos, com o agravante de não sabermos se é a melhor. Tampouco se é a pior. Mas isto não importa, desde que ela nos ajude a superar a materialidade, auxiliando-nos em nosso processo de espiritualização.
Este artigo terá continuidade na próxima edição.
Sandra e Luiz Pizarro
C. E. Vinha de Luz, Reg. SP-Centro