Gestos de amor: Espiritismo em Libras

Estima-se que cerca de 10 milhões de brasileiros sejam surdos. Boa parte deles se comunica em Libras (Língua Brasileira de Sinais), que é uma língua de modalidade gestual-visual.

Um dos desafios dos centros espíritas é oferecer palestras e conteúdos acessíveis para esse público. O Trevo reuniu abaixo dois depoimentos de espíritas com iniciativas de inclusão para surdos.

O sonho de criar uma Escola de Aprendizes do Evangelho em Libras

“Eu fui procurar o centro espírita quando perdi meu marido de forma trágica. Entrei em depressão. Frequentei vários centros, mas não havia me conectado espiritualmente.

Neste centro que frequento, eu me senti acolhida. Mas não sabiam como lidar com a minha deficiência. Perguntei se poderia levar intérprete, mas negaram alegando que a espiritualidade iria ajudar conforme a minha necessidade.

A casa não era da Aliança nessa época. Quem fazia a preleção, algumas vezes, era a entidade. Certa vez a espiritualidade pediu para aumentar a luz e disse: até aqui está bom. E depois perguntou pra mim se estava bom. Eu disse que dava pra fazer a leitura labial. Então começaram a deixar a luz mais forte para que eu pudesse fazer a leitura labial.

Mais tarde, a casa abriu as portas para intérprete de Libras, pois vieram três outros surdos. Eles, porém, não deram continuidade.

Dada a escassez de intérpretes, atualmente estou dando um curso básico de Libras online, para voluntários da Evangelização Infantil, com a finalidade de preparar mais pessoas que consigam se comunicar utilizando Libras.

O curso acontece aos domingos, das 9h às 10h30, com alunos de diversas cidades. A turma é muito bacana, compreensiva e dedicada.

Sou a única surda que participa da Aliança dando as aulas. Estou chamando outros surdos para dar aula também, que são de outras instituições espíritas. Se houver interesse, abriremos uma turma de nível intermediário.

Temos algumas ideias para o futuro: oferecer o curso de Libras para todos e abrir uma Escola de Aprendizes do Evangelho para surdos. Eu estou adorando dar este curso e agradeço a oportunidade da convivência e experiência.”

Viviane Vinkauskas Geronymo é voluntária na Regional Campinas

A importância das atividades virtuais para a comunidade surda

“Olá! Me chamo Mônica, conhecida como Nika. Sou pedagoga, tradutora/intérprete de Libras e voluntária espírita bilíngue. Sou surda “metade” de nascença, com pais e uns tios surdos, portanto, minha primeira língua é Libras. Contudo, aprendi a segunda língua, o português, de maneira simultânea.

Frequentava uma palestra ou outra até que uma surda, amiga minha, insistiu para visitar a casa espírita que ela participava. Nessa casa, além da minha amiga e do marido dela, ouvinte intérprete de Libras, frequentavam mais três surdos, algo raro de se ver na seara do Espiritismo (isso em 2017, hein!).

Os dirigentes abriram as portas da inclusão e permitiram a realização de estudos só para surdos e a presença dos três queridos intérpretes de Libras nas palestras públicas e no atendimento fraterno.

Eu também participava de um grupo de estudo espírita bilíngue via WhatsApp, mas infelizmente ele foi encerrado em plena pandemia. Com isso, muitos surdos do grupo começaram a me procurar solicitando uma espécie de atendimento fraterno: escuta, prece, entendimento espírita de algumas situações do cotidiano. Foi quando percebi que tinha muito a contribuir e busquei grupos que atuavam nessa causa.

Encontrei a FEEB (Federação Espírita do Estado da Bahia) em 2021. Eles iniciaram em 2020 um trabalho bilíngue virtual, com intérprete de Libras. Me tornei voluntária nas traduções Libras/Português de textos espíritas usados nos grupos de estudo. A FEEB criou o departamento Libras e Espiritismo para atender virtualmente muitos surdos brasileiros de vários Estados que não encontram casas espíritas preparadas para acolhê-los.

Os trabalhos espíritas virtuais são de grande importância para os surdos. Embora a maioria dos espaços espíritas virtuais sejam mais direcionados aos estudos e palestras, já existem encontros online bilíngues com passes, atendimento fraterno, mocidade e até a parte mediúnica.

Além da tradução em Libras, cabe ao irmão ouvinte bilíngue entender o surdo como um sujeito espiritual, social, político, histórico, cultural e linguístico permeado por diferentes vivências e experiências.

Eu sou espírita virtual, mas quero também encontrar uma casa espírita física e dar a minha contribuição. Estou confiante na espiritualidade amiga como parceira nesta jornada.”

Nika Tintore é intérprete em Libras e voluntária espírita

Navegue:

Compartilhe: